Estamos vivenciando um momento singular. O mundo trava uma guerra com um monstro invisível. No meio dessa batalha um novo monstro nasce. Há grandes desafios pela frente, mas o primeiro e mais importante é agora. Qual a melhor estratégia para vencermos dois monstros ao mesmo tempo? COVID-19 x Recessão Econômica. Não é sobre qual monstro bate mais forte ou qual é mais nocivo. É sobre como vencer duas ameaças antes de um colapso eminente na saúde e na economia.
Até a noite de 24/03/2020, foram registradas 20 mil mortes em todo o mundo pela pandemia do novo coronavírus, que já contaminou mais de 400 mil pessoas em 177 países. Dentre os países mais afetados, a Alemanha é a que tem conseguido os melhores resultados no controle e número de mortos. A justificativa é dada pelo pesquisador Christian Drosten, chefe do hospital Charité, da Universidade de Humboldt e da Universidade Livre de Berlim: “Acredito que a Alemanha reconheceu a epidemia muito cedo. Estamos duas ou três semanas à frente dos nossos vizinhos. Conseguimos fazer isso, graças ao alto número de diagnósticos e testes”. No Brasil, estima-se que os números sejam 11 vezes maiores do que os divulgados, justamente pelo baixo número de pessoas testadas, o que pode ocasionar a propagação do vírus por pessoas assintomáticas. A Alemanha está prestes a colher os frutos das medidas implementadas, com a estabilização da curva ascendente de novos casos.
No Brasil, o presidente Jair Bolsonaro atacou as medidas de contenção dos governadores e indicou que as escolas devem retomar as atividades normalmente, reafirmando que somente os idosos fazem parte do grupo de risco. Tal postura contraria o consenso mundial, visto que muitos outros líderes estão implementando medidas ainda mais restritivas na tentativa de contenção do vírus. Bolsonaro parece seguir a mesma linha do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que já anunciou que deseja aliviar o confinamento e reativar a economia em até três semanas. “ Nosso país não foi projetado para fechar”, disse Trump à Fox News.
O mundo sempre foi polarizado, agora a briga é sobre quem vem primeiro, saúde ou economia. O caos econômico está batendo em nossas portas, ou melhor, já está na nossa sala.
No comércio exterior, por exemplo, já estamos vendo falta de containers nos Portos, que em sua maioria encontram-se estagnados na China, a disponibilidade de espaço em navios e aeronaves está extremamente restrita, ocasionando sobretaxa nos embarques. Com algumas fronteiras ainda fechadas na China, há ausência até mesmo de papelão para embalar cargas com destino à exportação. Com muitos aeroportos fechados para voos comerciais, fica mais evidente no mercado também que nem todos os países tem voos cargueiros diretos com destino ao Brasil. Os aviões cargueiros disponíveis no mercado não dão conta do tráfego de cargas e sem a diluição de cargas em voos comerciais de passageiros, os preços das tarifas sobem progressivamente. Cada vez que um exportador embarca seus produtos e existe dificuldade no desembarque os custos aumentam. O custo da diária de um navio, varia de 50 mil dólares a 100 mil dólares. Alguém vai pagar essa conta.
A China é o principal país importador e exportador do mundo. Com a gigante participação no comércio global, tudo que acontece na China tem reflexo e é por isso que o monstro cresce em maior velocidade.
Num artigo publicado no The New York Times, pelo Dr. David Katz, especialista em saúde pública e medicina preventiva, o médico diz que “há três objetivos neste momento: salvar tantas vidas quanto possível, garantindo que o sistema de saúde não entre em colapso, mas também garantir que no processo de atingir os dois primeiros objetivos não destruamos nossa economia, e como resultado disso, ainda mais vidas. ”
Katz diz que o mundo tem que pivotar da estratégia de “interdição horizontal” para uma estratégia de “interdição vertical”, ou seja, a abordagem vertical focaria em proteger e isolar os que correm maior risco de morrer ou sofrer danos de longo prazo. Katz ainda sugere que o isolamento atual dure duas semanas.
A realidade econômica do Brasil é bem diferente de muitos países da Europa. A renda média da família brasileira é de 400 dólares, enquanto que a renda média da família italiana, por exemplo, é de mais de 2.000 dólares. A estratégia de interdição horizontal no Brasil é perigosa e preocupa.
O risco é eminente, nunca há risco zero. Economia e saúde convergem no medo, a velocidade de transmissão do vírus e seu amplo alcance geográfico impõem o caos no sistema de saúde e, principalmente, nos mercados mundiais. Precisamos agir, há dois monstros aí fora. Essa luta é de todos. Estamos todos no mesmo barco. Não é hora de polarizações e disputas individuais.